domingo, 8 de fevereiro de 2015

Brincante - o filme ou a arte de brincar a sério

Domingo 08, hoje, mês do Carnaval. O baixo Augusta fervia. Gente, muita gente. A estação Consolação despejava umas 1000 pessoas por minuto, jovens e coloridos, na sua maioria, que desciam rua abaixo, cerveja na mão e diversão na cabeça (ops... não seria no pé?). De túmulo do samba, para a capital dos blocos, São Paulo, é a cidade que  sempre surpreendente.
Como não aprendi a dançar nem a seguir bloco e já sem paciência para começar e muito menos pernas pra aguentar maratonas, refugiei-me, como de hábito, no cinema. Oscar? Coisa nenhuma. Primeiro, porque as sessões dos filmes concorrentes ao prêmio já estavam todas lotadas com muita antecedência. Segundo, porque gosto sempre que possa de prestigiar o cinema nacional. Acertamos, desta feita, em cheio, Brincante, um filme de Walter Carvalho sobre e com o grande artista Antônio Nóbrega. Nada mais apropriado do uma hora e meia de puro lirismo dançante para este mês de samba.
Walter Carvalho (Central do Brasil, Amarelo Manga, etc. e tal) arrasa nas tomadas, na luz, na ousadia dos incríveis enquadramentos. Mais do que um adorável passeio pelo universo fantástico da arte desse múltiplo artista, constituído pelo amálgama da erudição e da cultura popular brasileira que por sua vez vai lá atrás beber do trovadorismo e do nosso imaginário, o filme é uma grande homenagem a São Paulo, onde mais de metade do filme é ambientado, cidade onde o artista fixou residência e montou o já lendário Instituto Brincante (à beira do despejo e do desprezo local).
O diretor optou por um documentário que não é exatamente um documentário, mas também não é exatamente uma ficção (vale-se de personagens de ficção encarnados pelo próprio Nóbrega) e dispensa praticamente a palavra. A história desse artista é contada através de sua própria arte. Um artista que "brinca" a sério. A viagem da "fubica", uma velha camionete que serve de casa, palco e teatro sobre rodas, por ele mesmo conduzida, sempre acompanhado de sua parceira na vida e na arte (a atriz Rosane Almeida) é metáfora dessa trajetória. Inicia percorrendo cidades estradas de terra do Estado de Pernambuco (Nóbrega, como se sabe é pernambucano), entra e se fixa, como ele mesmo se fixou, na cidade de São Paulo.
A paisagem interna (o palco, o recolhimento do estúdio) vai se alternando com a externa (a dança de rua), ora no alto dos edifícios e viadutos, ora nos parques, no vão livre do MASP, na Av. Paulista e muitos outros locais, apropriando-se da cidade, palco a céu aberto cenário de belíssima coreografias. A trilha sonora, criada em processo colaborativo, é a cara disso tudo, a cara do Brasil.  
Suassuna teria adorado ver seu pupilo ali, na telona, em pleno vigor de seus mais de 60 anos, arte nordestina/brasileira nas veias, talento levado às alturas.

Como disse, na estreia, o diretor Walter Carvalho, "cinema não é pra ganhar Oscar, mas para emocionar pessoas". Emocionei-me, voltei mais leve e com mais orgulho desta terra que elegi como minha. (dtv)


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